quinta-feira, abril 01, 2010

Pensamentos de William Faulkner



Sobre a arte do escritor

Um escritor é uma criatura arrastada por demônios. Não sabe por que o escolheram, e normalmente está ocupado demais para se perguntar isso. É totalmente amoral, pois irá roubar, mendigar, pedir emprestado ou furtar de quem quer que seja para ver seu trabalho realizado. A única responsabilidade do escritor é para com sua arte. Será inteiramente desapiedado se for um bom escritor. Tem um sonho. Isso o angustia tanto que ele tem que se livrar dele. Não tem paz até então. O resto vai por água abaixo: honra, orgulho, decência, segurança, felicidade, tudo. Para que o livro seja escrito. Se um escritor tiver que roubar a sua mãe, não hesitará; a “Ode a uma urna grega” (John Keats) vale mais do que qualquer punhado de velhas.


Sobre o melhor ambiente / emprego para um escritor

O melhor emprego que já me foi oferecido foi o de zelador de um bordel. Na minha opinião, é o ambiente perfeito para um artista trabalhar; (...) tem um teto seguro e nada para fazer, senão cuidar de umas poucas contas e ir uma vez por mês pagar à polícia local. O lugar é quieto de manhã, que é a melhor hora para se trabalhar. Há bastante vida social à noite, se ele quiser participar para não se aborrecer; (...) todos os moradores da casa são mulheres, que o acatariam e o chamariam de ‘doutor’. Todos os contrabandistas de bebida da região também o chamariam de ‘doutor’. E ele poderia tratar os policiais pelo primeiro nome.


Sobre o trabalho

Na minha opinião é uma vergonha que haja tanto trabalho no mundo. Uma das coisas mais tristes é que a única coisa que um homem pode fazer oito horas por dia, dia após dia, é trabalhar. Não se pode comer oito horas por dia, nem beber oito horas por dia, nem fazer amor oito horas por dia – tudo o que se pode fazer durante oito horas é trabalhar. É esse o motivo pelo qual o homem torna, a si e a todos os demais, infelizes e miseráveis.


Sobre a subvenção oficial à cultura

Eu nunca soube que algo bom em literatura tivesse se originado da aceitação de uma oferta gratuita em dinheiro. O bom escritor nunca pede auxílio a uma instituição cultural. Está ocupado demais escrevendo alguma coisa. Se não é um escritor de primeira classe, ilude-se dizendo que não tem tempo ou liberdade econômica. Pode surgir arte boa de assaltantes, contrabandistas ou ladrões de cavalo. As pessoas na verdade têm medo de descobrir que podem suportar muita adversidade e pobreza. Têm medo de descobrir que são mais resistentes do que pensam. Nada pode destruir o bom escritor. (...) Se um homem não é um escritor de primeira classe, então não há nada que possa ajudá-lo muito, porque aí já vendeu sua alma por uma piscina.


Sobre o sucesso

O sucesso é feminino, é como uma mulher; se você se curva diante dela, ela passa por cima de você. Então o jeito de tratá-la é dar-lhe as costas da mão. Aí, talvez, ela venha a rastejar.


Sobre a relação crítica literária / escritor

O artista está um degrau acima do crítico, pois está escrevendo alguma coisa que porá o crítico em movimento. O crítico está escrevendo alguma coisa que porá todo o mundo em movimento, menos o artista.


Sobre a psicanálise

Todo mundo falava de Freud quando eu vivia em Nova Orleans, mas nunca o li. Nem Shakespeare o leu. Duvido que Melville o tenha lido, e tenho certeza de que Moby Dick não o fez.


Sobre a questão racial nos EUA (especificamente a partir do célebre ‘caso Emmet Till’)

Se nós, americanos, sobrevivermos, será porque escolhemos, elegemos e defendemos ser antes de tudo americanos; apresentar ao mundo uma frente homogênea e inquebrantável, seja de americanos brancos ou negros, roxos, azuis ou verdes. Talvez a finalidade desse triste e trágico erro, cometido por dois brancos adultos contra uma sofrida criança negra, seja provar se merecemos ou não sobreviver. Porque se nós, na América, chegamos ao ponto, na nossa desesperada cultura, de assassinar crianças, seja por qual razão ou cor, não merecemos sobreviver, e provavelmente não sobreviveremos.


Sobre pessoas que alegam não entender seus livros, mesmo após os lerem duas ou três vezes

Que leiam quatro vezes.


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Ten. Giovanni Drogo

Forte Bastiani

Fronteira Norte - Deserto dos Tártaros

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