quarta-feira, maio 02, 2018

A arte do futuro


Alphonse van Worden - 1750 AD

Em seu ensaio The Study of Mathematics (1919), Bertrand Russell afirmou o seguinte a propósito do elemento estético presente na matemática:

Mathematics, rightly viewed, possesses not only truth, but supreme beauty — a beauty cold and austere, like that of sculpture, without appeal to any part of our weaker nature, without the gorgeous trappings of painting or music, yet sublimely pure, and capable of a stern perfection such as only the greatest art can show. 

Mais ou menos à mesma época, o deífico Paul Valéry , num de seus magníficos escritos para a série Variété (ora não me recordo precisamente qual), declarou que se calhar seu desiderato supremo seria a criação d'uma 'Commedia da inteligência'. Dante escrevera a Divina, Balzac a Humana; Valéry, por seu turno, almejava a da abstração total. Analogamente, em determinada passagem de seus Cahiers, chega a afirmar que uma demonstração matemática proporcionava-lhe maior deleite e satisfação estética que a leitura d'um romance. Vale lembrar, outrossim, que o escritor francês especulou sobre a possibilidade de uma história da literatura que não mencionasse autor algum, mas que de facto fosse concebida como uma espécie de história do Espírito Universal enquanto produtor de literatura.

Pois bem: socorro-me das reflexões de dois gênios incontestáveis para porventura dar sustentação a uma aspiração sempre mais intensa em minh'alma. Com efeito, desejo cada vez mais uma arte olímpica, imaculada, impassível, glacial, hierática, sublime, mítica, irreal. Uma arte (também no plano literário, convém sublinhar) ao fim e ao cabo inumana, que não pareça brotar de qualquer criador individual, mas sim surgir como emanação involuntária do Cosmo ou inefável manifestação divina. Uma 'arte das esferas' que se propague lenta e indefinidamente por espaços infindos e silêncios eternos, curva assimptótica em direção ao Fogo Sagrado do Infinito. 

Em suma: ambiciono uma arte praticamente fora do tempo e do espaço, que já nasça clássica e universal, para todos e para ninguém.