quarta-feira, fevereiro 02, 2011

Considerações a propósito da GRANDE SÍNTESE: repensar a II Guerra Mundial - I

Alphonse van Worden - 1750 AD






Áticos irmãos d'armas:

Consoante já sublinhamos em reiteradas ocasiões, a peregrinação em direção à GRANDE SÍNTESE eurasiana, isto é, a convergência entre as principais correntes filosóficas e ideológicas anticapitalistas e antiburguesas, por um lado; e por outro, as tradições esotéricas da revolta irracionalista contra a 'Sociedade Aberta' ao longo da História será, há que admitir, sobremaneira longa e tortuosa. Há inúmeras arestas e incompreensões mútuas a serem aparadas; séculos de mal-entendidos (não raro disseminados por nossos adversários); ressentimentos; discrepâncias conjunturais de ordem política; enfim, toda uma série de equívocos e distorções, conscientes ou não.

Para tempo, iniciaremos o supracitado ciclo com algumas considerações sobre a milenar rivalidade entre duas potências telurocráticas de fundamental importância para a concretização projeto eurasiano: Alemanha e Rússia.

Trata-se d'um processo que remonta mormente ao século XIII, quando Aleksandr Yaroslavich Nevskij, Príncipe de Novgorod e Vladimir, derrotou a Ordem dos Cavaleiros Teutônicos, sob o comando do príncipe Hermann de Dorpat, na Batalha do Lago Peipus (1242), localizado na fronteira entre a Estônia e a Rússia. (O episódio foi celebrizado pelo cineasta soviético Sergei Eisenstein num filme extraordinário: Aleksandr Nevskij - 1938).

E no âmbito de nosso esforço em aplainar o terreno para a Nova Ordem, uma das etapas mais importantes é a compreensão da II Guerra Mundial como a mais terrível tragédia que se abateu sobre a GRANDE SÍNTESE, adiando-a por várias décadas, quiçá até por séculos. Parece-me claro que o contencioso ancestral entre povos eslavos e germânicos por si só não logra explicar / justificar um conflito da magnitude da II Guerra Mundial.

Lembro-me, a esse respeito, da memorável assertiva d'um saudoso professor de filosofia (de quem tive a honra de ser discípulo n'outros lustros), proferida em tom de divertida boutade, mas sem dúvida portadora d'um acurado senso de verdade: 

"A batalha de Stalingrad foi a manifestação concreta do conflito teórico entre hegelianos de esquerda e de direita".

Com efeito, ele estava certo: a II Guerra Mundial representou, em última instância, a trágica oposição, convertida em mortífera guerra de extermínio, entre dois 'grandes irmãos' que, de certa forma, jamais lograram perceber, de um lado,  a profunda unidade metafísica e teleológica existente entre ambos; e de outro,a comunhão de interesses geopolíticos no âmbito do conflito permanente  entre as duas dinâmicas que ditam o compasso da História: o eurasianismo telurocrático e o atlantismo talassocrático.

Vale salientar, à partida, que a tragédia acima referida não se dá apenas no plano ideológico ou espiritual, mas também na esfera das relações materiais.  A esse respeito, é assaz instrutivo observarmos a situação vivida, tanto pela Alemanha nazista quanto pela URSS stalinista, durante a década de 30 da última centúria.

O aspecto precípuo a ser ressaltado, quero crer, é a irreprochável constatação de que ambas atravessavam uma fase de acelerada expansão econômica.

O país dos soviets, muito embora sacudido até os alicerces pelas ondas sísmicas deflagradas com a 'revolução pelo alto' de Stalin entre 1930 / 31 (processo de coletivização da agricultura, implementação do 'stakhanovismo' super-industrialista de Kuybishev & cia.), esteve blindado contra os efeitos da devastadora crise de 29, e com com isso singrou de vento em popa os oceanos da industrialização, levando a efeito em menos d'uma década o que a Europa Ocidental levou quase 100 anos para realizar. Estima-se, vale dizer, que a URSS, caso a II Guerra não houvesse ocorrido, superaria tanto a economia norte-americana quanto o conjunto das economias desenvolvidas da Europa em menos de 20 anos.

A Alemanha nazista, por seu turno, logrou recuperar-se em tempo record da abissal depressão econômica em que o país esteve mergulhado durante toda a década de 20, através d'uma espécie de 'keynesianismo militar avant la lettre', com o Estado atuando decisivamente como indutor do crescimento; assim sendo, estancou em definitivo a espiral inflacionária que corroía as finanças do país; converteu o desemprego num problema meramente residual; e last but not the least, promoveu um desenvolvimento inaudito em termos de evolução tecnocientífica.



(Continua)

O 'Problema da Indução' em Charles Sanders Peirce

Alphonse van Worden - 1750 AD




Não seria desarrazoado afirmarmos, conforme já salientamos adrede n'outros escritos, que o Problema da Indução origina-se, em boa parte, do fato de pretendermos aplicar nas inferências indutivas os mesmos critérios de validação vigentes no âmbito da lógica dedutiva; poderíamos, talvez, argumentar que o cerne do referido problema está na possibilidade de justificarmos, de um modo não necessariamente dedutivo, os resultados de uma generalização indutiva a partir das premissas existentes.

É precisamente neste sentido que se orientam as reflexões sobre nosso Problema levadas a cabo por Charles Sanders Peirce (1839-1914), filósofo e lógico norte-americano.

Consideremos agora, pois, a seguinte hipótese por ele sugerida: em nossa experiência passada, direta ou indireta, podemos afirmar, com absoluta certeza, que as pedras que arremessadas livremente ao solo de fato caíram no chão. Tal assertiva nos abre duas possibilidades:

(a) ou bem a uniformidade com que todas estas pedras caíram se deve à pura casualidade e não proporciona qualquer fundamento para que possamos esperar que a próxima pedra arremessada caia;

(b) ou então a uniformidade com que as pedras caíram se deve a um princípio geral ativo, e no caso em questão seria pura coincidência que parasse de atuar no momento em que minha previsão está se baseando nele. As pedras caem, constatamos isso.

Como, no entanto, podemos justificar a expectativa de que próxima pedra que arremessemos ao solo também cairá? E este conhecimento deve ser formulado no sentido de que possamos afirmar as proposições a seguir:

(1) eu tenho uma crença justificada de que se arremesso a pedra, ela cairá

e

(2) é verdade que quando arremesso a pedra, ela cai, ou seja, compreende duas instâncias, a justificação da crença e a verificação desta.

Todavia, a verificação só constata a veracidade de casos particulares e, desse modo, não é um meio para justificar um enunciado geral. Mais ainda: é possível conceber que as pedras, ao serem arremessadas, não caiam, tal como aconteceria em um ambiente livre de gravidade. Em outras palavras: existem mundos possíveis onde tal enunciado não é verdadeiro; e se existem condições que inequivocamente falsificam nosso enunciado, como poderemos justificar que sobre se tenha uma crença racional?

Entretanto, argumenta Peirce, nossa experiência demonstra de sobejo que ao soltarmos uma pedra, ela cai (a não ser que estejamos em um ponto de gravidade zero); como tal fato sempre aconteceu, ou existe uma lei causal que está por trás deste fenômeno, ou então sempre foi regido pelo puro acaso; mas, como a probabilidade de que se deva ao acaso é mínima, devemos concluir que da referida experiência é possível inferir uma lei causal.