quarta-feira, julho 01, 2009

Esquerda contemporânea: entre a FARSA e o AUTISMO

Alphonse van Worden - 1750 AD




Egrégios irmãos d'armas:

A grande tragédia, a verdadeira MALDIÇÃO que tomou conta de grande parte da esquerda contemporânea, pode ser definida da seguinte maneira: a demoníaca ideologia globalista, com toda a sua crença no governo mundial, nas intervenções 'humanitárias' (a piada do século, sem sombra de dúvida), na atuação das ONG's, enfim, em toda essa tralha escabrosa, contaminou, se calhar de modo indelével, os corações e mentes da 'esquerda' nos tempos que correm.

Ora, qualquer cidadão com um mínimo de lucidez (e mesmo os conservadores honestos sabem muito bem disso, que ninguém se equivoque a esse respeito...) percebe que a ideologia globalista não passa d'uma bem articulada cortina de fumaça criada para ocultar dois propósitos muito objetivos e insofismáveis:


a) garantir a liberdade de ação do grande capital financeiro, já que hoje há um entrelaçamento dinâmico e contínuo entre todos os mercados; assim sendo, nada como uma intervenção 'humanitária' para restaurar a 'boa vontade' de uma nação que, por acaso, teve a audácia de não conformar-se às maravilhas do livre mercado;

b) promover  a difusão maciça e sistemática de todos os valores dissolventes que caracterizam a nebulosa ideológica da modernidade, tais como multiculturalismo, relativismo, queer theory, feminismo, discriminação positiva, correção política, etc.


Ou seja: trata-se d'um projeto de índole profundamente imperialista e reaccionária; mas que, contudo, muito bem embalado pelo sedutor canto da sereia 'póóóóish-modéééérna', hipnotizou uma esquerda emasculada, desorientada, e que, há pelo menos três décadas, já abdicara por completo de sua grande tarefa histórica: a abolição do Capitalismo.

Destarte, o que agora temos é um contínuo showroom de sedativos ideológicos, todos eles alegremente ingeridos pela 'esquerda moderna': 'ações afirmativas'; 'ação da sociedade civil organizada'; 'intervenções humanitárias'; 'trabalho voluntário'; etc., etc., etc., todos eles criados e difundidos com um único e nefasto móvel: paulatinamente alienar os partidos e movimentos de esquerda de seu objetivo precípuo, vale dizer, tomar de assalto o aparelho do Estado para dar início à construção d'um novo modelo de organização social.

Então, o que está em pauta pelo menos desde a década de 90 do século XX é toda uma dinâmica, muitíssima bem urdida, planejada, articulada e propagada, para desmoralizar o papel do Estado como indutor por excelência de qualquer processo efetivo de transformação social. Assim sendo, eis os temas dessa pérfida cantilena: 'Quem precisa do Estado? 'Qual nada, a ação da sociedade civil organizada resolve tudo!'; 'Soberania nacional? 'Bah, uma velharia inaceitável, a ONU e as ONGs têm o sagrado dever de implementar ações humanitárias em nações governadas por regimes tirânicos e desumanos!' (ou seja, o velho "fardo do Homem Branco" de Kipling reembalado em cores vistosas para a 'esquerda' tutti-frutti); 'despertar nas massas o ímpeto revolucionário? 'Não, imagina, tudo pode ser resolvido com as ações solidárias do trabalho voluntário!'; e por aí vai, tudo com o intuito de entorpecer / enfraquecer / desestimular / desmoralizar qualquer esforço em prol de projetos de transformação social genuinamente revolucionários e efetivos.

Podemos asseverar, enfim, sem qualquer hesitação, que o processo de deterioração intelectual, moral e política das esquerdas nas últimas décadas assumiu uma intensidade assombrosa, mormente a partir do colapso da URSS em 1991.

E um aspecto particularmente emblemático do supracitado fenômeno é, sem sombra dúvida, este heteróclito e estrambótico circo de cavalinhos chamado Fórum Social Mundial.

Prezados confrades, o que seria o Fórum Social Mundial? Uma ridícula pantomima onde todos em uníssono proclamam que "um outro mundo é possível", mas nada de realmente CONCRETO levam a efeito para colocar tal ideal em prática? Um colossal desfile de miríades de movimentos sociais, cada qual trombeteando aos quatro ventos sua pauta específica, numa caótica Babel de slogans não raro antagônicos? Uma espécie de anestésico, lenitivo moral, para apaziguar a consciência culpada de burgueses angustiados (grande parte da esquerda universitária inclusa), conferindo-lhes a doce ilusão de estarem contribuindo para um 'mundo melhor'? Um bom palco para políticos matreiros venderem seu peixe? Ou tudo isso e mais alguma coisa, enfim, um frenesi de idéias e sentimentos pré-fabricados, que partem de coisa alguma para chegar a lugar nenhum?

Muito bem: é justamente essa risível 'esquerda bubblegum fórum social mundial', ou seja, essa farândola de farsantes, que ainda tem o desplante de verberar contra os movimentos Terza Posizione / 4tp, ou seja, a única corrente política contemporânea engajada num amplo processo de refundar a ação política em bases verdadeiramente novas e revolucionárias!

Abordando a outra faceta desse fenômeno, consideremos agora as organizações de esquerda que ainda mantêm certa fidelidade ao ideário revolucionário d’outrora. Enquanto o oportunismo a todo pano é a marca registrada da esquerda circense, a característica mais lôbrega nos bastiões da esquerda tradicional é a flagrante incapacidade de romper com o rigor mortis dos esquematismos ideológicos, com a fixidez estéril dos dogmatismos monocromáticos. É sobremaneira trágico, vale sublinhar, que tais setores não entendam o seguinte: admirar / advogar uma determinada característica / elemento de uma corrente ou regime político, NÃO significa que sejamos obrigados a inexorável e necessariamente comprar o pacote completo da perspectiva ideológica adjacente, tal como se fosse um vestido prêt-à-porter.

Assim sendo, é possível apreciar, por exemplo, e não temos o menor pejo em negá-lo, certos aspectos do fascismo italiano, mormente no que se refere à sua incorporação da distinção soreliana entre as noções de 'mito' (numa acepção político-ideológica do termo) e 'utopia' (ideal). O 'mito revolucionário' funcionaria como profecia autorrealizável, no sentido de não depender de fatores transcendentes para ser levado a efeito; a meu ver, Mussolini percebeu essa questão com impressionante perspicácia; podemos também admirar, na mesma clave do espectro ideológico, o ‘Código de Honra’ da Legiunea Arhanghelul Mihail de Corneliu Codreanu, bem como seu programa de reforma agrária, inspirado na noção da gemeinschaft rural unitária e orgânica; e, outrossim, igualmente advogar, já noutra clave, as idéias do marxista peruano José Carlos Mariátegui a respeito da Revolução Social, que para ele não é fenômeno que se possa interpretar mediante uma análise científica, uma vez que não pode ser compreendido à luz dos pressupostos epistemológicos e metodológicos da razão lógico-demonstrativa; ao contrário, afigura-se muito mais como fenômeno de cunho mítico-religioso, impermeável a abordagens racionalistas.

E assim devemos seguir em frente, de mente, olhos e ouvidos abertos para o que houver de profícuo em cada corrente do pensamento político, à esquerda e à direita, na luta contra o capitalismo, o liberalismo e toda a nebulosa ideológica por trás da ‘Sociedade Aberta’.

É mister compreender, d’uma vez por todas, que os sistemas ideológicos fechados (comunismo, socialismo, anarquismo, fascismo, liberalismo, etc.) fracassaram redondamente, e já não correspondem às demandas e tarefas do presente. Há, portanto, que refundar todo o agir político em novas bases, incorporando o que há de aproveitável em cada perspectiva e descartando o restante. Ou será que a esquerda ainda dotada d’algum lastro ideológico minimamente consistente prefere proceder como uma horda de autistas, aprisionados no labirinto do automatismo psíquico, classificando a priori, sem o devido exercício da análise crítica, ‘y é bom / x é ruim / z é bom / a é ruim’. E isso o que efetivamente desejam, isto é, permanecer ad aeternum como zumbis, a vagar sem rumo por uma planície estéril, pejada de ruínas ideológicas do passado? Cito aqui uma instância de tal paralisia mental: bovinamente atrelados a uma agenda iluminista e libertária, já de todo prostituída pelas engrenagens de pasteurização ideológica do capitalismo contemporâneo, recusam-se a admitir o importantíssimo papel revolucionário desempenho pelo antiimperialismo da República Islâmica do Irã no contexto geopolítico hodierno. Como, pois, é possível admitir que qualquer indivíduo soi disant de esquerda,e que se pretenda minimamente bem-informado, desconheça o patente protagonismo de figuras como Mahmoud Ahmadinejad, Ali Khamenei, Hassan Nasrallah, Muqtadā al-Ṣadr, Khaled Meshaal, etc. no seio da luta antiimperialista em escala global?

Por fim, à guisa de conclusão, proponho aos confrades um breve exercício especulativo: se há já muitos lustros não temem a pantomima revolucionária da esquerda tradicional, os senhores acreditam, por exemplo, que um Barack Obama; uma Hillary Clinton; o diretor da CIA; os comandantes do Pentágono e da OTAN; um Benjamin Netanyahu; um Nicholas Sarkozy; uma Angela Merkel; os grandes empresários ou investidores internacionais; enfim, que qualquer liderança política, militar ou econômica do sistema de poder internacional, perca sequer MEIO SEGUNDO de sono preocupado com as ações dessa esquerda emasculada; siderada pelas ficções retóricas do humanismo iluminista; mais entretida em sair rebolando por aí em paradas gay, a fim de celebrar o sacrossanto direito dos homossexuais em dar o rabo, do que em formular novas táticas de ação revolucionária; de todo submissa, enfim, aos desígnios estratégicos do Capital, cujo principal talante hoje é enfraquecer a capacidade de atuação do Estado em nome do conveniente e inofensivo teatrinho de reivindicações da 'sociedade civil organizada'?