domingo, junho 01, 2008

'Governo Mundial' x República Islâmica do Irã

Alphonse van Worden - 1750 AD

Temos assistido nos últimos tempos a uma escalada da obscena campanha de desestabilização desencadeada pelas potências imperialistas, 'Grande Satã' à testa, contra a indômita República Islâmica do Irã. É ominoso propósito dos autonomeados ‘Senhores do Universo’ obstar o desenvolvimento econômico autônomo e soberano do país em tela, impedindo-lhe o pleno acesso à energia nuclear, recurso com o qual o país tenciona diversificar sua infraestrutura energética , tornando-se menos dependente da importação de combustível, uma vez que o refino de petróleo para tais fins torna-se a cada ano mais oneroso; assim sendo, querem os odiosos imperialistas levar a orgulhosa nação persa às barras do Conselho de Segurança da ONU, para assim apensar a chancela de uma pretensa legitimidade jurídica às sanções econômicas com que pretendem sufocar a ummah iraniana. Afortunadamente, contudo, a República Islâmica do Irã, representada pelo corajoso governo do presidente Mahmoud Ahmadinejad (cognominado como ‘ultraconservador’ pela mídia mainstream em sintomática operação de diversionismo conceitual , pois se trata de um legítimo reformador), bem como sob a lúcida e sábia égide do Ayatullah Khamenei, tem resistido valentemente a tais tentâmenes de chantagem.

Reiteradas vezes tem a República Islâmica do Irã asseverado não ser de seu talante a criação de um arsenal de armas atômicas, mas tão somente o emprego pacífico de tal tecnologia; não obstante, ainda que o país pretendesse levar a cabo um programa de armamento nuclear, isto lhe seria de lídimo e irreprochável direito, pois trata-se de decisão que compete tão somente à escolha soberana de cada nação, e não à ultrajante empáfia dos que se arrogam em donos do planeta. Destarte, tem a República Islâmica do Irã incontrastável direito à posse de dispositivos bélicos atômicos, caso julgue ser tal medida necessária à defesa de sua integridade territorial.

Ademais, há também nisto tudo um repulsivo componente de hipocrisia, pois todos sabem que o 'Pequeno Satã' dispõe de armamento nuclear, arsenal esse que o moloch sionista jamais poderia ter obtido caso não contasse com total anuência da parte de seus svengali estadunidenses para toda sorte de crimes e perfídias. Destarte, por que cargas d´água pode o Estado Sionista deter armas atômicas, enquanto isto é vedado à República Islâmica? Os baalberiths ‘intelectuais’ a soldo do Imperialismo apreciam imenso alegar que a ‘arquitetura internacional de poder’ seria abalada caso o Irã passasse a contar com armamento nuclear. Pois muito bem: e a quem a interessa a manutenção da atual estrutura geopolítica de poder? À imensa maioria da Humanidade ou a um punhado de nações que exploram indiscriminadamente o planeta como se este fosse seu quintal? Pouco importa, portanto, a vigência de tal ‘ordem’, uma vez que vai de encontro às necessidades e desígnios da maioria. Deve, pois, a República Islâmica do Irã infrene trilhar sua trajetória soberana, destinando seus investimentos em tecnologia nuclear da forma que bem lhe aprouver, quer seja para fins meramente civis, quer seja para objetivos militares.

Por fim, encerro tecendo algumas considerações para os que amiúde soem verberar contra o advento de um ‘Governo Mundial’, mas não conseguem reconhecer-lhe a verdadeira índole. Tais setores diagnosticam, com efeito, a progressiva ascensão d’uma espécie de governança planetária sob a égide da ONU, e que representaria a sinistra aliança entre um cipoal de partidos, movimentos e ONG’s globalistas/'esquerdizantes', de um lado, e os grandes interesses corporativos do capitalismo monopolista, de outro; como anteparo a tal dinâmica, costumam dizer, estaria os Estados Unidos da América, principal salvaguarda do capitalismo liberal e da democracia. Pois muito bem: os factos acima referidos ilustram precisamente a tentativa do ‘Governo Mundial’, com total apoio e incentivo dos EUA, em subjugar uma nação independente mediante toda sorte de pressões e ameaças. O que os apologistas de tal perspectiva teriam a dizer, portanto, a esse respeito?











Apontamentos sobre a 'Revolução Conservadora' I - Gabriele D'Annunzio e a Reggenza Italiana del Carnaro



Ora proponho, ó diletos confrades d'armas, que falemos a propósito de figuras que de certa forma encarnaram, mormente no século XX, o ideal d'uma 'revolução conservadora'. Dando partida a nossos trabalhos, discorrerei brevemente a respeito do célebre poeta 'decadentista' italiano Gabriele D'Annunzio (1863 - 1938) e sua romântica aventura política com a Reggenza Italiana del Carnaro.

D’Annunzio (assim como o alemão Ernst Jünger, o russo Dmitry Svyatopolk-Mirsky, o também italiano Julius Evola, entre outros) encarna um fenômeno ideológico deveras contraditório e fascinante: a perspectiva de uma ‘revolução conservadora’, que por um lado se formula como revolta contra a ‘modernidade’, encarada como monstruoso amálgama entre a frieza pragmática da lógica contábil do capitalismo e a autoritária uniformização social do socialismo; e por outro, pelo ideal de um retorno às tradições da Europa pré-capitalista, sobretudo no que tange ao resgate do universo fechado, unitário e integrado da Gemeinschaft medieval (sentimento, aliás, sintetizado à perfeição pelo alemão Novalis em seu ensaio A Cristandade ou a Europa - 1799, que se inicia com as seguintes palavras: “Belos, esplêndidos tempos: a Europa era terra cristã, e a Cristandade habitava una este recanto de mundo humanamente configurado...”).

Muito bem: num dos episódios mais extraordinários e insólitos da acidentada gesta política do século XX, um heteróclito contingente de 9.000 legionari, incluindo desde marinheiros rebeldes e militantes anarquistas a ocultistas, artistas, marginais e almas dissidentes de todos os quadrantes, sob o comando de D'Annunzio, ocupou a cidade de Fiume (atual Rijeka, porto croata encravado na Baía de Kvamer, no litoral do Mar Adriático) no dia 12 de setembro de 1919. O exército invasor demandava a anexação do território tomado à Itália, medida rejeitada pelo governo deste país, que decidiu bloquear a cidade para forçar os revoltosos à rendição; em resposta, D'Annunzio decidiu, em setembro de 1920, estabelecer Fiume como sede de um novo Estado, a Reggenza Italiana del Carnaro, com a promulgação de uma constituição, a Carta del Carnaro, assinada a quatro mãos pelo escritor e pelo anarco-sindicalista Alceste De Ambris, que estabelecia, entre outras coisas, a música como princípio fundamental do Estado:

 LXIV. Nella Reggenza italiana del Carnaro la Musica è una istituzione religiosa e sociale.Ogni mille anni, ogni duemila anni sorge dalla profondità del popolo un inno e si perpetua. Un grande popolo non è soltanto quello che crea il suo Dio a sua somiglianza ma quello che anche crea il suo inno per il suo Dio. Se ogni rinascita d'una gente nobile è uno sforzo lirico, se ogni sentimento unanime e creatore è una potenza lirica, se ogni ordine nuovo è un ordine lirico vigoroso e impetuoso della parola, la Musica considerata come linguaggio rituale è l'esaltatrice dell'atto di vita, dell'opera di vita (...).

 O documento, diga-se de passagem, é considerado uma das peças mais interessantes e originais do pensamento utópico em todos os tempos.

Vale sublinhar que o ideário d'annunziano glorificava, por um lado, a violência guerreira, o orgulho nacionalista, a pulsão messiânica, bem como o desprezo pela democracia, qualificando-se assim, tal como o futurismo marinettiano, como um dos antecedentes diretos do fascismo; e por outro, rejeitava a propriedade privada, traço que permite associá-lo à augusta tradição da revolta messiânica anticapitalista ao longo dos séculos. Vejam, por exemplo, esta bela e significativa passagem, presente num dos discursos proferidos pelo rocambolesco condottiere:

"Para nós, 'navegar' significa lutar (...) O resultado da batalha tem, para nós, pouca importância. Para nós, o combate tem a sua recompensa em si mesmo, ainda que não seja coroado pela vitória ... Enquanto isso, navegar é preciso. Mesmo contra a maré. Mesmo contra o rebanho. Mesmo que o naufrágio espere os solitários e orgulhosos emissários de nossa heresia".

Durante pouco mais de um ano, quando as forças de D'Annunzio se renderam após um bombardeio da marinha italiana em dezembro de 1920, Fiume foi cenário de uma experiência de insurreição poética, irredentismo romântico flamboyant e revolução messiânica veramente inédita: a 'administração' resumia-se praticamente à promoção de concertos, banquetes, saraus literários e orgias delirantes, com seu extravagante duce declamando poemas todas as noites da sacada do palácio de governo, sob o troar de canhões e fogos de artifício.

É mister, por fim, compreender a galharda epopéia d'annunziana como emblemática etapa no périplo da GRANDE SÍNTESE, que, por um lado, se estabelece como a convergência política e filosófica entre todas as correntes ideológicas anticapitalistas e antiburguesas; e por outro, como todas as tradições esotéricas da revolta irracionalista contra a 'Realidade' ao longo da História. Para que tal dinâmica seja possível há ainda, vale dizer, inúmeras arestas e incompreensões mútuas a serem aparadas; séculos de mal-entendidos (não raro disseminados por nossos adversários); ressentimentos; discrepâncias conjunturais de ordem política; enfim, toda uma série de equívocos e distorções, conscientes ou não, de maneira que o estudo de episódios como a Regenza del Carnaro revela-se como exercício de reflexão política deveras necessário e salutar para a concretização da auspiciosa Síntese político-messiânica adrede mencionada.


_________


Ten. Giovanni Drogo

Forte Bastiani

Fronteira Norte - Deserto dos Tártaros