sexta-feira, setembro 01, 2006

As mais belas mortes - III

Moritz Schlick (1882-1936)






































E aqui chegamos a um dos relatos mais lôbregos desta nossa ainda tão núpera série.

O filósofo, lógico e matémático germânico Moritz Schlick (1882-1936) é um dos ídolos deste vosso humílimo escriba. Ao lado de Carnap, Feigl, Nëurath e Hahn, foi um dos fundadores do célebre Círculo de Viena, assim como um dos mais destacados proponentes do positivismo lógico; seus trabalhos em tópicos como epistemologia, lógica matemática e filosofia da linguagem são de incomensurável relevância, sempre caracterizados por grande originalidade, suprema perspicácia e assombrosa capacidade analítica.

Prossigamos contudo, sem mais delongas, com nosso doloroso mister, por mais horribile dictu que nos seja: com o ascenso do nacional-socialismo na Alemanha e na Áustria, boa parte dos integrantes do Círculo emigrou para Inglaterra e EUA; Shlick, entretanto, decidiu permanecer em seu posto na Universidade de Viena, muito embora condenasse a ideologia nazi nos termos mais severos. Tal atitude converteu o eminente filósofo em persona non grata para os círculos nazistas, levando ao hórrido desenlace que agora relataremos: no dia 22 de junho de 1936, Schlick, que subia as escadarias da Universidade para ministrar uma aula, foi abordado por um antigo aluno, então convertido ao nazismo. Transtornado, o sicofanta protestou a propósito de um trabalho que havia sido recusado pelo mestre; Schlick ripostou-lhe categoricamente as alegações, ao que o ínvio sacripanta sacou uma pistola e desferiu um balázio letal no peito do egrégio professor.


Post-Scriptum:

O horrífero sequaz nacional-socialista foi detido e setenciado, mas logo transformou-se em figura popular entre os extremistas de direita, sendo retratado pela imprensa reaccionária como 'herói nacional' em luta contra a filosofia pretensamente 'judaica' e 'anti-ariana' do Círculo de Viena; pouco depois da nefasta ocisão, o celerado recebeu liberdade condicional; e em 1938, com o advento do Anschluss, tornou-se um destacado membro do Partido Nazista Austríaco.

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Nikos Poulantzas (1936-1979)

























Mortes violentas e/ou espalhafatosas não são de modo algum, como os fidalgos leitores desta comunidade já devem ter advertido, apanágio de rockstars e outros seres extravagantes; já pudemos aqui abordar, com bem lembrais, o horrífero atentado que subtraiu a vida do lógico austríaco Moritz Schlick. Hoje, todavia, falaremos da defunção do filósofo marxista grego Nikos Poulantzas (1936-1979) (va benne, estava mais para um filosofante 'marxóide', mas tal maledicência não vem ao caso no momento...).

Poulantzas formou-se em direito na cidade de Atenas, e depois prosseguiu seus estudos em França e Alemanha, especializando-se na questão do Estado moderno. Em Paris tornou-se o discípulo favorito de outro notório detraqué, o estruturalista Louis Althusser (sobre o qual ulteriormente falaremos n'outro tópico). No dia 3 de outubro de 1979, agarrado a vários livros, Poulantzas arrojou-se do décimo-primeiro andar de um edifício popular nos arrabaldades de Paris (13 arrondissement). No bilhete de despedida pelo filosófo legado encontrou-se a seguinte observação, sobremaneira lúgubre e severa: "eu não suportava mais ser um escombro ideológico".

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Ten. Giovanni Drogo

Forte Bastiani

Fronteira Norte - Deserto dos Tártaros

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