Aplaudi, ó irmãos d'armas, mais este excelso fruto da parceria literária entre dois egrégios discípulos do cap. Van Worden: os srs. Alfredo d'Annunzio (ARRS) e Gabriel C. Rodriguez.
OPVS
*
Numa das mais antigas galerias comerciais da cidade de Ooth-Nargai, uma imponente estrutura em pórfiro, pavimentada por lajes de mármore negro e azul, e encimada por um teto rendilhado em hipnóticas abstrações geométricas, havia, segundo me disseram, uma fabulosa livraria, especializada em obras raras, e que possuía em seu acervo livros jamais editados, e até mesmo, especulava-se, manuscritos de obras imaginárias...
Morando nos arredores da cidade, cujo
centro parecia estar a cada ano mais distante, era-me custoso ir até a galeria,
uma vez que para nós, seres periféricos, tornava-se difícil a orientação nos
meandros labirínticos de uma arquitetura cada vez mais intrincada. A
necessidade, contudo, haveria de resolver a questão: um antigo pagamento, já há
muito prometido, finalmente estava à minha disposição. A sensação de poder
gerada pelo dinheiro (uma quantia bastante razoável, asseguro-lhes)
encorajou-me a procurar a famosa loja.
Ao atingir os majestosos portais de ônix que guarneciam sua entrada, percebi o profundo silêncio que emanava da galeria, em flagrante contraste com o ruído que se poderia esperar de um centro comercial. Não demorei a encontrar a livraria, cujo nome fazia jus à sua reputação:
Arcana Coelestia
Entrei. Os fregueses, imersos em seus
lúcidos sonhos, flutuavam ao redor das imponentes estantes, onde o périplo dos
séculos se dissolve em reflexos crepusculares.
Solitário, e bem no centro da livraria,
despertou-me atenção um alentado tomo de capa negra, pousado sobre um magnífico
pedestal em estilo bizantino.
Aproximei-me. O volume, encadernado em
marroquim, intitulava-se OPVS. O frontispício, igualmente
espartano, informava que a obra em questão era um manuscrito perdido,
encontrado pelo alquimista francês Fulcanelli (1839 - 1923) no ano de 1880 numa
biblioteca em Praga, e editado, em exemplar único, logo após a morte de seu
descobridor. Quanto à autoria, as referências eram outrossim crípticas: o
próprio Fulcanelli cria ser obra inexoravelmente entretecida per saecula saeculorum pelos fatais
sortilégios do DESTINO; consoante o
igualmente douto parecer de messire
Eugéne Canseliet, todavia, era mister atribuir OPVS aos fortuitos jogos
de ars combinatoria do ACASO...
Na página seguinte, li as seguintes
palavras:
Houve o conhecimento; doravante haverá o OPVS.
Eis a verdade da Fé: chegamos ao ponto derradeiro, à
última fronteira; à morte da palavra; ao fim da linguagem.
Todo o universo, os insondáveis desígnios do
universo, o verbo de deus, a dança de Shiva, os aeons de Brahman, concentram-se
na cosmogonia infinita de pontos insepultos...
Todo o Universo, temerário leitor... Pois também tu cá
estás: teus sentimentos, tuas mais recônditas memórias, tuas mais íntimas
sensações, o que jamais pensaste, mas poderias ter pensado, e até mesmo o que
ainda pensarás e sentirás.
Por teres ousado ler o que jamais deveria ser lido, aqui
permanecerás, defronte ao OPVS, pelos séculos dos séculos, imóvel e silente...
Ten. Giovanni Drogo
Forte Bastiani
Fronteira Norte - Deserto dos Tártaros