Alphonse van Worden - 1750 AD
O paradoxo em tela foi, por assim dizer, descoberto pelo ínclito lógico, matemático e filósofo inglês em 1901, quando este estava a preparar os textos que seriam reunidos em seu Principles of Mathematics (1903). Bertrand Russell considerava então a questão do 'Conjunto de todos os conjuntos que não são membros de si mesmos'. Tal conjunto parece ser um membro de si mesmo se e somente não for um membro de si mesmo. Alguns conjuntos tais como, por exemplo, o conjunto dos relógios de pulso, não são membros de si mesmo; outros conjuntos, tal como o conjunto de todos os 'não-relógios de pulso', são membros de si mesmos, uma vez que o conjunto não é um relógio. Muito bem: vamos chamar de S o 'Conjunto de todos os conjuntos que não são membros de si mesmos': se S não é membro de si mesmo, então, por definição, deverá ser membro de si mesmo; ou então, em outras palavras: há um conjunto S tal que, qualquer que seja x, x é um elemento desse conjunto se, e se somente se, x for um conjunto que não seja elemento de si mesmo.
O significado revolucionário do paradoxo pode ser avaliado ao constatarmos que, à luz dos princípios consagrados pela lógica aristotélica, todos os sistemas formais são passíveis de contradição lógica. Mais ainda: nenhuma prova matemática poderia ser digna de confiança se a chamada 'Teoria dos Conjuntos ingênua', subjacente a todo o arcabouço matemático, abriga uma contradição fundamental. Da mesma maneira: como assegurar a validade de um enunciado científico ou filosófico face à possibilidade de algo possa ser e não ser ao mesmo tempo?
Houve várias tentativas de resolução deste dilema, a começar pela Teoria dos Tipos Lógicos proposta por Russell e Whitehead nos Principia Mathematica (1910 / 1913), que institui uma hierarquia lógica de conjuntos: o primeiro tipo de conjunto seria formado pelos conjuntos integrados apenas por entes particulares; a seguir, procedemos para os conjuntos cujos membros são conjuntos do primeiro tipo, estabelecendo assim o segundo tipo de conjunto; então para os conjuntos cujos membros são conjuntos do segundo tipo, que formariam o terceiro tipo de conjunto, e assim sucessivamente. Destarte, ao lidarmos com afirmações do gênero do paradoxo de Epimênides ("todos os cretenses são mentirosos") ou, numa formulação mais simples, "eu estou mentindo", é preciso estabelecer em que contexto da hierarquia dos tipos lógicos tal assertiva está sendo proferida. Se Epimênides replicar, por exemplo, que está a afirmar uma proposição falsa do primeiro tipo, então tal enunciado, visto referir-se ao conjunto das proposições de primeiro tipo (que são os elementos constitutivos do segundo tipo lógico), será um enunciado de segundo tipo; logo, não é verdade que Epimênides está a sustentar uma proposição falsa do primeiro tipo, mas sim de segundo tipo; de todo modo nosso amigo segue sendo um mentiroso, tão somente operando uma clave acima em termos de hierarquia lógica. Da mesma maneira, se Epimênides alegar que estava a postular uma proposição falsa do tipo 500.000, esta seria um enunciado do tipo 500.001, de modo que ele ainda permaneceria um mentiroso; outrossim, desaparece o contra-argumento empregue para sustentar que ele ao mesmo tempo não é um mentiroso.
Vale dizer que a Teoria dos Tipos também fornece uma solução para outras indagações, tais como, por exemplo, a concernente à existência ou não de um número cardinal máximo; neste caso, a resposta dependerá inteiramente do fato de estarmos ou não nos referindo a um determinando tipo lógico. Dentro de qualquer tipo lógico, existe uma cardinalidade máxima, a saber, o número de objetos daquele tipo, mas sempre seremos capazes de obter um número maior rumando para o próximo tipo; não existe, portanto,no seio de um dado tipo lógico, nenhum número maior do que o que podemos obter mediante a proposição de tipos lógicos mais elevados.
Claro está que tudo isto se tornaria mais rigoroso e preciso mediante o emprego de formalismo lógico, com os quantificadores e operadores adequados.
Por fim, outras possibilidades de resposta ao dilema russelliano estão presentes nas lógicas trivalentes, concebidas mormente por autores da escola polonesa de Lvov e Varsóvia (Lukasiewicz, Lesniewski, Kotarbinski); nas hipóteses metamatemáticas de Alonzo Church; ou então na lógica paraconsistente de Da Costa e Jaskowski.
O paradoxo em tela foi, por assim dizer, descoberto pelo ínclito lógico, matemático e filósofo inglês em 1901, quando este estava a preparar os textos que seriam reunidos em seu Principles of Mathematics (1903). Bertrand Russell considerava então a questão do 'Conjunto de todos os conjuntos que não são membros de si mesmos'. Tal conjunto parece ser um membro de si mesmo se e somente não for um membro de si mesmo. Alguns conjuntos tais como, por exemplo, o conjunto dos relógios de pulso, não são membros de si mesmo; outros conjuntos, tal como o conjunto de todos os 'não-relógios de pulso', são membros de si mesmos, uma vez que o conjunto não é um relógio. Muito bem: vamos chamar de S o 'Conjunto de todos os conjuntos que não são membros de si mesmos': se S não é membro de si mesmo, então, por definição, deverá ser membro de si mesmo; ou então, em outras palavras: há um conjunto S tal que, qualquer que seja x, x é um elemento desse conjunto se, e se somente se, x for um conjunto que não seja elemento de si mesmo.
O significado revolucionário do paradoxo pode ser avaliado ao constatarmos que, à luz dos princípios consagrados pela lógica aristotélica, todos os sistemas formais são passíveis de contradição lógica. Mais ainda: nenhuma prova matemática poderia ser digna de confiança se a chamada 'Teoria dos Conjuntos ingênua', subjacente a todo o arcabouço matemático, abriga uma contradição fundamental. Da mesma maneira: como assegurar a validade de um enunciado científico ou filosófico face à possibilidade de algo possa ser e não ser ao mesmo tempo?
Houve várias tentativas de resolução deste dilema, a começar pela Teoria dos Tipos Lógicos proposta por Russell e Whitehead nos Principia Mathematica (1910 / 1913), que institui uma hierarquia lógica de conjuntos: o primeiro tipo de conjunto seria formado pelos conjuntos integrados apenas por entes particulares; a seguir, procedemos para os conjuntos cujos membros são conjuntos do primeiro tipo, estabelecendo assim o segundo tipo de conjunto; então para os conjuntos cujos membros são conjuntos do segundo tipo, que formariam o terceiro tipo de conjunto, e assim sucessivamente. Destarte, ao lidarmos com afirmações do gênero do paradoxo de Epimênides ("todos os cretenses são mentirosos") ou, numa formulação mais simples, "eu estou mentindo", é preciso estabelecer em que contexto da hierarquia dos tipos lógicos tal assertiva está sendo proferida. Se Epimênides replicar, por exemplo, que está a afirmar uma proposição falsa do primeiro tipo, então tal enunciado, visto referir-se ao conjunto das proposições de primeiro tipo (que são os elementos constitutivos do segundo tipo lógico), será um enunciado de segundo tipo; logo, não é verdade que Epimênides está a sustentar uma proposição falsa do primeiro tipo, mas sim de segundo tipo; de todo modo nosso amigo segue sendo um mentiroso, tão somente operando uma clave acima em termos de hierarquia lógica. Da mesma maneira, se Epimênides alegar que estava a postular uma proposição falsa do tipo 500.000, esta seria um enunciado do tipo 500.001, de modo que ele ainda permaneceria um mentiroso; outrossim, desaparece o contra-argumento empregue para sustentar que ele ao mesmo tempo não é um mentiroso.
Vale dizer que a Teoria dos Tipos também fornece uma solução para outras indagações, tais como, por exemplo, a concernente à existência ou não de um número cardinal máximo; neste caso, a resposta dependerá inteiramente do fato de estarmos ou não nos referindo a um determinando tipo lógico. Dentro de qualquer tipo lógico, existe uma cardinalidade máxima, a saber, o número de objetos daquele tipo, mas sempre seremos capazes de obter um número maior rumando para o próximo tipo; não existe, portanto,no seio de um dado tipo lógico, nenhum número maior do que o que podemos obter mediante a proposição de tipos lógicos mais elevados.
Claro está que tudo isto se tornaria mais rigoroso e preciso mediante o emprego de formalismo lógico, com os quantificadores e operadores adequados.
Por fim, outras possibilidades de resposta ao dilema russelliano estão presentes nas lógicas trivalentes, concebidas mormente por autores da escola polonesa de Lvov e Varsóvia (Lukasiewicz, Lesniewski, Kotarbinski); nas hipóteses metamatemáticas de Alonzo Church; ou então na lógica paraconsistente de Da Costa e Jaskowski.
2 comentários:
Muito interessante o texto. Sou estudante de Ciência da Computação, e sempre tive interesse pela Lógica, apesar de não ter feito mais que apenas alguns estudos superficiais. Infelizmente no momento estou completamente sem tempo, mas pretendo no futuro estudar mais profundamente esses assuntos.
Bruno 'Embryo'.
Obrigado, confrade. :-)
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