quinta-feira, setembro 01, 2011

A propósito do conceito de KATECHON na Cristandade contemporânea


Alphonse van Worden - 1750 AD






 Em entrevista a respeito do pensador católico Joseph de Maistre, o também francês Philippe Sollers faz uma observação severa, malgrado deveras pertinente, sobre a situação da maior parte dos católicos na sociedade contemporânea:


Les catholiques ne veulent pas être catholiques. Ils font du bricolage, mais ne savent rien. L’ignorance sur les questions religieuses est quasiment totale. Je passe mon temps à voir des gens qui ne savent pas ce que c’est. Alors, ils voient à peu près les fêtes, encore que savoir ce qu’est l’Ascension, l’Assomption, la Pentecôte… Ils ne peuvent même pas écouter une messe, car ils ne savent pas de quoi ça parle. Ils sont donc extérieurs à la culture occidentale. 


É emblemático atentar para o facto de que Sollers, mesmo tendo recebido educação religiosa, está longe de ser o que se poderia chamar de um 'escritor católico'; mesmo assim, ao afirmar justamente que os católicos que desconhecem a substância mais profunda de sua religião culturalmente não fazem parte do Ocidente, diagnostica com precisão cirúrgica um dos mais graves problemas enfrentados hoje pela fé católica.

Tais reflexões nos conduzem, parece-me claro, à seguinte assertiva: sem Ocidente não existe Igreja, da mesma maneira que sem Igreja não há Ocidente. Recorrendo aqui às Escrituras, quero crer que a afirmação acima fica mais cabal a partir do que está disposto em 2 Tessalonicenses 2: 3-7:


3 Ninguém de modo algum vos engane. Porque primeiro deve vir a apostasia, e deve manifestar-se o homem da iniqüidade, o filho da perdição,

4 o adversário, aquele que se levanta contra tudo o que é divino e sagrado, a ponto de tomar lugar no templo de Deus, e apresentar-se como se fosse Deus.


5 Não vos lembrais de que vos dizia estas coisas, quando estava ainda convosco?


6 Agora, sabeis perfeitamente que algo o detém, de modo que ele só se manifestará a seu tempo.


7 Porque o mistério da iniqüidade já está em ação, apenas esperando o desaparecimento daquele que o detém. 



 Trata-se, com efeito, da célebre passagem bíblica em que S. Paulo menciona a figura do Katechon, isto é, 'aquele' ou 'aquilo' que detém o 'adversário'. O caráter notoriamente críptico dos supracitados versículos suscitou, claro está, diversas interpretações: qual seria, enfim, a força capaz de deter, durante sua permanência ao longo dos séculos, o advento do Anticristo: O Império Romano? A Igreja? o Papado? O Sacro Império?

Seja qual for a interpretação adotada, contudo, verifica-se que natureza primordial de o Katechon consiste num poder que seria a própria seiva vital da Cristandade. A meu juízo, tal poder é a Civilização Católica, sob a égide dos ‘dois gládios’: o Império e Igreja.

 Isto posto,áticos irmãos d'armas, indago: o progressivo afastamento entre tal civilização e seu alicerce espiritual não simbolizaria, de certo modo, o encerramento do ciclo histórico do Katechon e, portanto, a aproximação do Final dos Tempos?

 Muitos católicos, a meu juízo, desconsideram, ou pelo menos subestimam, o caráter da Igreja como instituição histórica, humana. O próprio Cristo, como Filho de Deus, está fora do Tempo, mas Seu advento constitui inequivocamente um facto histórico, que engendrou circunstâncias analogamente históricas. A Igreja é a manifestação da providência divina no curso da História; outrossim, Seu destino não pode ser dissociado do contexto histórico-civilizacional em que surgiu.

 A Igreja, Corpo Místico de Cristo, é a dimensão espiritual e teológica que informa o Katechon. Não obstante, para ser protegida na esfera temporal, a Igreja carece d'uma salvaguarda, que é a civilização católica sob a égide d'um Império. O Katechon emerge, portanto, como a unidade orgânica entre Igreja, Civilização Católica e Império. E tal unidade enfraquece a olhos vistos desde o século XVIII.

 Poder-se-ia argüir a hipótese, de todo cabível no âmbito da omnipotência divina, d’uma Cristandade estabelecida n’outro contexto e circunstância; todavia, é mister admitir que a Societas Christiana; efetivamente existente não pode ser dissociada das instituições históricas em que se encarna; do contrário, estaríamos a considerar meras possibilidades, e não a realidade.

 Sob a égide da Igreja, encarnação histórica do Corpo de Cristo, e do Sacro Império, herdeiro político do Império Romano, forja-se a Cristandade. Com o Cisma de 1054, a Cristandade se divide entre a civilização católica, à oeste, e a ortodoxa, à leste. Ainda assim, contudo, conservam-se os elementos centrais da fé cristã, tanto no Ocidente católico quanto no 'Oriente' ortodoxo. Permanece intacto, com efeito, o Katechon durante todo o transcurso do Medievo. A Reforma Protestante constitui, entretanto, um trágico ponto de inflexão, vale dizer, o início de um processo paulatino, malgrado contínuo, de 'descristianização' do Ocidente, que se acentuaria significativamente com o advento da Hidra Iluminista, filha dileta das ignomínias de Lutero e Calvino.

Hoje, no século XXI, perante uma Igreja cada vez menos influente no seio da civilização que deveria ser sua salvaguarda, talvez não seja irrazoável dizer que, muito em breve, deixaremos de contar com a proteção do Katechon. Há que sublinhar que o termo final da descristianização do Ocidente seria - que o Altíssimo nos livre disto! - o dobre de finados da Igreja, a morte do Katechon; e, portanto, a clave para a vinda do Anticristo.

 Ainda há tempo, não obstante, para lutar: muito embora a civilização católica forjada pela Igreja seja hoje, em larga escala, parte do passado, é preciso salientar que a Santa Madre (apesar de todos os 'modernismos') segue atuando sob a égide dos princípios, rituais e ordenamentos que nortearam a Civiltá Catolica. Assim, o verdadeiro 'Ocidente', como conjunto de valores e visão de mundo, continua a existir, ainda que precariamente, no seio da Igreja. Estejamos, contudo, em guarda: caso a Santa Madre perca seu propugnáculo temporal, a substância primordial que a informa não logrará sobreviver.



 

6 comentários:

Anónimo disse...

Alphonse van Worden, qual é a sua opnião acerca do eixo Irã, Venezuela e Coréia do Norte?

Anónimo disse...

Alphonse, o que vc está propondo não é tão impossível assim, olha a notícia que saiu no site do Dugin.

THE FRANCO-GERMAN EMPIRE: HERE AND NOW
At the end of January the press reported the sensational news about the decision of France and Germany to be united in a single state.

Alphonse van Worden disse...

Não creio que cheguem a formar um 'eixo', confrade, no sentido de que não há uma política externa unificada a guiar as ações dos 3 países.

Não obstante, certamente são peças cruciais (mormente a Rep. Islâmica) no xadrez antiimperialista.

Alphonse van Worden disse...

A notícia aludida é deveras alvissareira, contanto que tal fusão se dê a contrapelo dos desígnios atlantistas e se estabeleça, portanto, como etapa para a formação do bloco eurasiano.

Anónimo disse...

Alphonse van Worden, na sua opnião após a vitória da Revolução Islâmica no mundo, haverá mais liberdade ?

Anónimo disse...

KILL KILL KILL!!!!!!!!!111