sábado, agosto 01, 2009

Breve nota a propósito de sir Alfred Joseph Hitchcock





Que dizer a respeito d’um artista que já foi objeto de toda sorte de escrutínio, lucubração, exegese e especulação? Difícil acrescentar algo de interessante ou relevante; não obstante, tendo em vista que as empreitadas mais árduas soem ser as mais gratificantes, creio que é válida a tentativa. Enfim, vamos lá!

Muito bem: malgrado sejam afirmações de todo procedentes, asseverar que Alfred Hitchcock é um ‘mestre do suspense’, ou que possui uma habilidade ímpar em manipular com acuidade cirúrgica os mais recônditos desvãos da psique do espectador, seria simplesmente, como reza o velho adágio popular, “chover no molhado”; assim sendo, gostaria de ressaltar aqui outro aspecto, igualmente fundamental, na obra do cineasta inglês.

Quando ainda era crítico da Cahiers du Cinema, Jean-Luc Godard certa feita escreveu que Alfred Hitchcock era “o mais alemão dos cineastas ocidentais”. Trata-se, vale dizer, d’um juízo sobremaneira críptico, ao menos à partida: estaria o diretor francês ironicamente afirmando, por exemplo, que tão somente o cinema anglo-americano poderia ser tido como ‘ocidental’? Apenas conjecturo, todavia.


Não obstante, há na observação godardiana um dado deveras significativo, ainda que relativamente pouco mencionado, quando se fala a propósito de Hitchcock: caudatário das melhores tradições do cinema expressionista alemão, o opus hitchcockiano é uma verdadeira aula magna em termos de requinte formal e elegância estrutural: seus planos são virtuosos, plenos de geométrica exatidão; os enquadramentos, muito embora dotados d’um rigor milimétrico, não raro assombram o público com angulações inusitadas e vertiginosas (como esquecer, por exemplo, a assombrosa sequência do assassinato no parque de diversões em Strangers on a Train - 1951?); a montagem, vero relógio atômico em termos de precisão, ajusta-se com inacreditável perfeição às exigências da narrativa; o espectral chiaroscuro da fotografia de suas fitas em P&B logra evocar a ominosa fantasmagoria dos melhores momentos de um Murnau; a câmara, por fim, como se fosse o finíssimo estilo de bambu nas mãos de um calígrafo nipônico, esparge na tela silhuetas, texturas e matizes de refinada fatura.

Celebremos, pois, a figura de Alfred Hitchcock, esse “pintor de pesadelos vivos” (como admiravelmente escreve o sociólogo franco-brasileiro Michael Löwy, a respeito de Kafka), criador genial tanto na arte de suscitar no público seus temores mais abissais, quanto no exercício do cinema como veículo de transcendência estética.

*

Ten. Giovanni Drogo

Forte Bastiani

Fronteira Norte - Deserto dos Tártaros

1 comentário:

Anónimo disse...

bom comeco