Desde os idos de 1996, quando o guitarrista, enciclopédia ambulante de música weird e auto-proclamado guru patafísico japonês Makoto Kawabata, egresso de experiências delirantes com formações tais como Mainliner e Musica Transonic, decidiu criar a banda / comuna sônico-místico-transcendental Acid Mothers Temple & The Melting Paraiso U.F.O. (Underground Freak Out), o universo vem sendo assolado por um abstruso maremoto cósmico de ultra-psicodelia psicótico-mind blowing de proporções absurdamente inauditas: Kawabata e sua impagável troupe de psycho-freaks (uma extravagante entidade polimórfica cujo número de integrantes varia entre 4 e 15 componentes) lograram, pois, resumir / reciclar / sublimar / expandir toda a multitentacular garage hermétique da psicodelia ao longo dos anos, levando à máxima perfeição um mister em que os filhos do Sol Nascente se revelam particularmente eficazes: o reprocessamento criativo de tradições culturais alienígenas.
Como descrever o mefistofélico sabbath sônico conjurado pelo AMT? Pensem numa espécie de usina nuclear musical, onde foram precipitados como combustíveis todo o krautrock de matriz psicodélica (Guru Guru, Ash Ra Tempel, Amon Düül II, Brainticket, Cosmic Jokers, etc.); ‘artefactos’ desarvorados da cena psych européia dos anos 60-70 (Le Stelle di Mario Schifano, Parson Sound, Älgarnas Trädgård, Alrune Rod, Povl Dissing, etc.); os titãs transatlânticos da psicodelia estadunidense (de nomes notórios como Blue Cheer e Jimi Hendrix à monstruosidades terminais como Father Yod, Anal Magic & Rev. Dwight Frizzell, Cromagnon, etc.); anomalias britânicas da estirpe de Hapshash & The Coloured Coat, Deviants, etc.; a alquimia eletrônico-minimal de Terry Riley, Steve Reich e outros luminares. Considerada toda essa assombrosa plêiade de influências, tentem agora imaginar tudo isso levado às últimas conseqüências da desmesura sônica intergalática, arsenal esse ambientado em diversas formulações, que variam desde narcolépticos e gentis drones de corte folk-psicoativo a descomunais maelstrons elétricos encharcados de avassaladoras microfonias guitarrísticas over the top, assombrações apavorantes de teclados space rock em colapso nervoso e magma percussivo estraçalhante... can you dig it…?
Consegui até agora reunir, devo dizer, apenas 7 ‘emanações’ do AMT, uma fração modesta de seu vastíssimo output, considerando que a prolífica gang de Kawabata lança de 5 a 6 discos por ano desde sua fundação, num montante que já atinge mais de 40 álbuns. Todavia, o álbum em tela - Electric Heavyland, lançado em 2002 pelo selo canadense Alien8 - tem sido considerado pelos mais refinados experts em AMT como a mais intensa e insana tempestade de desespero eletromagnético e devastação mastodôntica já urdida pela banda. Tal avaliação crítica não poderia ser, creio eu, mais precisa e acertada: o que temos aqui são 3 assombrosas, avassaladoras jams ultra/mega/hiper-psicodélicas, avalanches incontroláveis de white noise desfechadas por Kawabata formando walls of sound de energia vulcânica em estado magmático, ladeadas pelos a um só tempo lancinantes e hipnóticos space whispers de Cotton Casino, as devastadoras rajadas metálico-percussivas de Koizumi, a catatonia trovejante do baixo de Tsuyama e as espectrais muralhas alucinatórias de found sounds e efeitos eletrônicos produzidas pelos synths de Higashi e Casino. Descrever estas faixas em detalhe, tal como alguns resenhadores pateticamente tentaram fazer, me parece uma lide de todo insensata e improfícua, pois elas formam um continuum cuja coerência e significado tão somente se desvelam através de uma visão de conjunto.
Enfim... that’s all, folks, mas com a velha e cautelosa dica de costume: é uma obra aconselhável apenas para os mais afeitos a turbulentos cataclismas sonoros, isto é, para maníacos dotados de ouvidos devidamente ‘formatados’ por anos e mais anos de experiência com mutilações sonoras da mais alta periculosidade e octanagem, não digais depois que não vos avisei!
Ten. Giovanni Drogo
Forte Bastiani
Fronteira Norte - Deserto dos Tártaros
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